Desde 1857, quando 130 trabalhadoras foram mortas em Nova Iorque, no dia 8 de março, buscamos refletir sobre a igualdade de direitos entre homens e mulheres. Com o objetivo de impulsionar a consciência e a luta. Por incrível que possa parecer, as reivindicações da greve dessas mulheres assassinadas no século XIX eram a redução da jornada de trabalho, a equiparação de salários com os homens e tratamento digno dentro do ambiente de trabalho. Familiares, não?
Sim, houve avanços. E 8 de março é o momento de também lembrar as conquistas sociais, políticas e econômicas das mulheres. Foi superada a maioria das disparidades no que se refere à educação, à saúde e à violência. No Brasil, a maior conquista veio em 1988, com a Constituição Federal, que consagrou, pela primeira vez na história do País, a igualdade de gênero como direito fundamental. A Lei Maria da Penha, em 2006, trouxe mecanismos de combate à violência contra a mulher. E nesta semana em projeto aprovado pelo Senado, o feminicídio passa a ser considerado crime hediondo.
Como tudo tem um porém …
Desde a entrada da mulher no mercado do trabalho ouvimos uma expressão que quase se naturalizou: “jornada dupla”. Fala-se até em jornada tripla de trabalho para as mulheres. Essas expressões são usadas para explicitar que além do trabalho formal, a mulher desempenha a maioria das tarefas da casa e com os filhos e, muitas ainda estudam.
Pesquisa realizada pela Plan, organização internacional que atua na defesa de direitos da criança, confirma que a jornada dupla feminina, no Brasil, começa já na infância. A desigualdade é absurdamente gritante na distribuição de tarefas domésticas entre meninas e meninos. O abismo se explicita ao constatar que 81,4% das meninas relataram que arrumam a própria cama, tarefa que só é executada por 11,6% dos irmãos meninos. 76,8% das meninas lavam a louça e 65,6% limpam a casa, enquanto apenas 12,5% dos irmãos fazem a primeira tarefa e 11,4% desempenham a segunda.
A violência contra as mulheres ainda é acentuada. Mancha vergonhosa de nossa cultura, apesar do aumento substancial de denúncias contra homens agressores, ainda marca nossa sociedade e nossas consciências de forma cruel.
A igualdade total entre homens e mulheres ainda está distante
Os pontos da desigualdade entre homens e mulheres são emblemáticos. Para além da divisão das tarefas familiares, as oportunidades profissionais e econômicas e a participação na política são sintomas clássicos de uma sociedade patriarcal, machista e desigual em todos os seus aspectos. O abismo salarial entre os dois sexos, os poucos cargos políticos ocupados por mulheres e a desigualdade no acesso à educação são desafios imperantes. As mulheres ocupam a maioria dos bancos das universidades e estudam mais que os homens, mas, em termos proporcionais, ingressam menos que os homens no ensino fundamental e seus salários são inferiores, comparando-se mesmos cargos e mesmas funções.
Apesar de representarem 51,95% do eleitorado no país, o percentual de mulheres no Congresso Nacional não chega a 10%, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Mulheres governadoras, prefeitas e vereadoras ainda são significativamente minoria. A socióloga Joluzia Batista destaca que “Geralmente, as candidaturas de mulheres, sobretudo essas de trajetória de luta popular e comunitária, não são atraentes para o perfil dos financiamentos [de campanha]. Esse é um dado crucial. Tanto é que defendemos a reforma do sistema político e uma das questões é o financiamento público de campanha”.
A luta continua
As mulheres, apesar da caminhada, ainda estão sujeitas a discriminações e violências. Cora Coralina, ao dizer “Eu sou aquela mulher que fez a escalada da montanha da vida removendo pedras e plantando flores”, expressa muito do que nossas bravas companheiras vivem e nos ensinam.
O movimento sindical tem atuado constante e firmemente para a conquista da igualdade entre homens e mulheres. Brasília teve o privilégio de ter a primeira mulher presidente de uma CUT estadual: a companheira Elzira Maria do Espírito Santo. Posteriormente Erika Kokay e Rejane Pitanga deram continuidade ao processo de reconhecimento da atuação da mulher trabalhadora nas organizações sindicais.
A CUT continuou pioneira ao aprovar em seu 11º Congresso Nacional a paridade entre homens e mulheres nas instâncias de direção (nacional e estaduais), prevista para acontecer nas eleições de 2015, durante o 12º CONCUT a realizar-se em outubro.
O debate sobre a paridade de gênero se amplia. No ramo financeiro, onde o capitalismo soube aproveitar bem as capacidades ditas masculinas, as mulheres igualaram seu percentual de presença. Na Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf/CUT), o Coletivo Nacional de Mulheres Bancários toma como base a fala de Boaventura Santos para debater e aumentar a representatividade de gênero em no mínimo 40% na composição da direção. O sociólogo português diz: “Temos o direito de ser iguais quando a nossa diferença nos inferioriza; e temos o direito de ser diferentes quando a nossa igualdade nos descaracteriza. Daí a necessidade de uma igualdade que reconheça as diferenças e de uma diferença que não produza, alimente ou reproduza as desigualdades”. Capitaneada pela companheira Deise Recoaro, a Secretaria de Mulheres da Confederação coordena as ações o Dia Internacional da Mulher 2015, que tem como motivação “Nós somos muitas e queremos mais” igualdade de oportunidades, fim do assédio moral e das discriminações e relações compartilhadas.
Na mesma via segue a Federação dos Trabalhadores em Empresas de Crédito do Centro Norte – FETEC-CUT/CN, que também realiza o Encontro das Mulheres Trabalhadoras agora em março.
A luta das trabalhadoras por igualdade, liberdade e autonomia, faz com que a CUT realize de 27 a 29 de março de 2015, em Brasília, o 8º Encontro Nacional da Mulher Trabalhadora, que está sendo precedido de encontros estaduais para aprofundarem o debate e ampliarem propostas a serem levadas ao evento nacional.
Enfim, as mulheres aproveitam março, o mês especialmente feminino, para marcar posição e refletir com toda a sociedade o avanço e, principalmente os desafios ainda a serem enfrentados. As atividades buscam uma compreensão politizada para os problemas da mulher. Desafiam os homens para pensarem no entendimento que eles têm deles mesmos e das relações pessoais e sociais. As políticas públicas contribuem substancialmente para o avanço. Precisamos, mulheres e homens darmos um salto qualitativo na compreensão da igualdade. Além da divisão das tarefas domésticas, do cuidado das crianças, é preciso que tenhamos todas e todos a percepção sensível para com a participação igualitária também nos espaços públicos, como nos sindicatos e nas CUTs.
As ações provocam a superação dos obstáculos e a impulsão do nascimento efetivo novos homens e novas mulheres, capazes de superar a cultura do patriarcado e fazer com que as conquistas e realizações individuais sejam igualitárias para ambos os sexos. Os ganhos individuais somados se multiplicam, ampliam e fortalecem o coletivo e dão sentido cooperativo, social e socialista à convivência humana. A participação das mulheres é decisiva para que a humanidade consiga superar suas desigualdades. Numa sociedade ainda dominada pela polaridade masculina é vital que a natureza feminina possa permear cada vez mais os espaços cotidianos e políticos. Por isso, toda a nossa solidariedade e inserção na luta das mulheres da CUT.
* Jacy Afonso é secretario de organização da CUT Nacional e militante da Articulação Unidade na Luta