Por: Francisco Dandão
Paranaense de Quinta do Sol, Edmar Batistela Tonelly migrou para o interior de Rondônia aos 17 anos, em 1989, no intuito de acompanhar e ajudar nos preparativos do casamento de um irmão. Mas o que, em princípio, deveria ser uma visita passageira transformou-se numa história de vida, uma vez que Edmar jamais abandonou a Amazônia desde então.
Hoje, 25 anos depois daqueles primeiros dias no município rondoniense de Rolim de Moura, Edmar Batistela, presidente eleito do Sindicato dos Bancários do Acre desde 2012, acumula uma biografia recheada de lutas sociais, em prol de uma conjuntura que permita melhores condições de vida para servidores e usuários do sistema bancário brasileiro.
Nas linhas que seguem vão transcritos os principais trechos de uma conversa que tivemos na sala de trabalho do referido personagem, centro de Rio Branco, numa tarde de quinta-feira, véspera do carnaval de 2014, quando, apesar de mais uma alagação flagelando a cidade, já se podiam ouvir nas ruas vizinhas os primeiros sons da denominada Folia de Momo.
Francisco Dandão – Presidente, fale do seu início como bancário… Como e quando isso aconteceu?
Edmar Batistela – Eu me iniciei como bancário no interior de Rondônia, município de Rolim de Moura, no extinto Banco Bamerindus do Brasil. Fiz um teste passei e fui admitido imediatamente. Na época não existia concurso para admissão nos bancos privados. O candidato fazia apenas um teste, no caso de conhecimentos gerais, português, matemática e datilografia. Por incrível que possa parecer hoje, o teste de datilografia era essencial para a admissão como bancário [sorrindo divertido]. Isso aconteceu no dia 1º de fevereiro de 1990.
Francisco Dandão – E no banco HSBC, ao qual você pertence hoje, como é que você entrou?
Edmar Batistela – Um ano depois de entrar no Bamerindus, em Rolim de Moura, eu fui transferido para Porto Velho. Em 1992 eu recebi um convite para vir para o Acre. Aceitei e fiquei até 1995, trabalhando na agência centro do Bamerindus, em Rio Branco. Neste mesmo ano voltei para Porto Velho, onde permaneci até 2002. Mas aí, nesse meio tempo, precisamente em 1997, o Bamerindus foi vendido para o HSBC, que aproveitou os quadros anteriores da instituição. Em 2002, já no HSBC fui remanejado para o interior do Pará, cidade de Monte Dourado, parte do Projeto Jari. Depois, em 2004, veio outra transferência, desta feita para Santarém, também no Pará. A volta para o Acre deu-se em 2006. Surgiu uma vaga no Acre, eu me candidatei e estou aqui até hoje.
Francisco Dandão – Sobre o seu ingresso no movimento sindical… Em que momento você entendeu que deveria ser sindicalista?
Edmar Batistela – Eu sempre fui ligado às lutas de classes. Mesmo pertencendo aos quadros de um banco privado, eu sempre entendi que devia lutar em prol das reivindicações dos trabalhadores. Eu sempre fui sindicalizado, embora não fizesse parte do núcleo dirigente dos sindicatos. Eu era militante das causas sociais e sindicais, sem fazer parte dos corpos diretivos. Em 2009, como o HSBC não tinha nenhum bancário ocupando cargo de direção no sindicato, eu fui convidado para fazer parte da chapa da companheira Elmira Farias. Aceitei prontamente e comecei a trabalhar na condição de segundo secretário.
Francisco Dandão – E daí do posto de segundo secretário até o cargo de presidente, como foi que se deu essa ascensão?
Edmar Batistela – Após várias conversas com os diretores daquela gestão da companheira Elmira, bem como com os companheiros que poderiam vir se agregar à nova gestão, eu coloquei o meu nome como possível candidato à presidência do sindicato, propondo que se houvesse consenso de que seria o melhor para a categoria, eu estaria disposto a assumir a direção da entidade. O que se viu foi um expressivo apoio dos companheiros, bem como da direção que estava saindo. Um apoio que se traduziu nas diversas urnas em todo o Estado, que me deram mais de 96% dos votos, conferindo-me um mandato de 3 anos, de 2013 a 2015.
Francisco Dandão – Quais as suas principais bandeiras de luta enquanto dirigente maior da categoria bancária no Acre?
Edmar Batistela – São várias as bandeiras de luta atuais do Sindicato dos Bancários do Acre. Mas talvez as de maior destaque sejam às metas abusivas exigidas pelos bancos e o assédio moral praticado por alguns dirigentes. O bancário hoje é sobrecarregado com metas absurdas, que mais parecem metas de vendedores do que de bancários. Não é possível ter qualidade na prestação do serviço ao público com as metas que os bancos querem fazer cumprir. E quanto ao assédio moral, prática essa que degrada o servidor bancário, é outra praga que já passa da hora de ser definitivamente banida no âmbito do serviço prestado pelos bancos. Fora isso, há uma luta intensa para que os bancários trabalhem apenas durante seis horas, evitando um desgaste físico e mental que acaba depreciando a qualidade do serviço prestado à população. O público precisa ser bem atendido, mas esse bom atendimento fica comprometido se o bancário extrapola a sua capacidade física e mental, como querem alguns chefes.
Francisco Dandão – Você falou em assédio moral… Eu gostaria que você falasse mais um pouco sobre isso.
Edmar Batistela – O assédio moral acontece quando um gestor persegue um bancário, tratando-o de uma forma diferenciada daquela de outros colegas. Esse assédio pode acontecer de várias maneiras, seja isolando o trabalhador, seja sobrecarregando-o com metas inatingíveis. Humilhação, discriminação, tudo isso acarreta em assédio moral do gestor contra o bancário. Já foram registradas situações até de demissão do bancário, por conta do assédio moral. É preciso ter muito cuidado porque a linha entre assédio moral e a cobrança por metas plausíveis é muito tênue. É verdade que todos somos cobrados, nas mais variadas circunstâncias da vida, mas essas cobranças devem ser feitas com parcimônia e respeito, dento dos limites do possível, nunca mais do que isso.
Francisco Dandão – Nesses dois anos à frente do Sindicato dos Bancários do Acre, o que foi que já deu efetivamente pra ser feito?
Edmar Batistela – A gente já conseguiu levar para os bancários a segurança do sindicato, aquilo que o sindicato representa para a categoria. Pode-se dizer também que conseguimos interiorizar o sindicato, porque antes, até pela dificuldade de estar presente nas diversas regiões do Estado, as demandas sindicais ficavam mais concentradas na capital. Hoje o sindicato atende todas as demandas dos sindicalizados em todas as regiões do Estado. Existem várias situações concretas, nesse sentido. É o caso, por exemplo, de uma demanda surgida em Assis Brasil, lá na fronteira com o Peru, quando o sindicato esteve no local ajudando a melhorar o atendimento praticado pela agência da Caixa Econômica Federal da localidade. Até problemas com funcionamento de aparelhos de ar condicionado, que ocorreu em Cruzeiro do Sul, foram resolvidos com a participação do sindicato. Então, hoje o sindicato está presente em todas as unidades bancárias sediadas no Estado. Isso tem fortalecido bastante o sindicato. O sindicato está cada vez mais presente na vida do sindicalizado, defendendo e respeitando o trabalho da categoria. Penso que essa é a principal realização desta diretoria.
Francisco Dandão – Como é a sua relação com os dirigentes de bancos, levando em conta todos os embates, os reiterados conflitos, a tensão rotineira?
Edmar Batistela – Existe uma correlação de forças. O dirigente sindical está nessa condição para desenvolver um trabalho social, de benefícios a toda a classe trabalhadora. Na verdade, a luta não é somente pelos bancários. A luta é também pela segurança no trabalho, pelo fim dos terceirizados, que são pessoas que ganham um salário mínimo para ficar no banco durante oito horas diárias, por um ticket alimentação digno etc. Toda essa luta causa uma correlação de forças muito grande com os patrões. É uma briga, vamos dizer assim, contra cachorros grandes. Os lucros dos bancos tem sido estratosféricos e eles cada vez querem mais, repassando o mínimo tanto para a sociedade, de modo geral, quanto para os bancários, de modo específico. Há uma dificuldade muito grande nessa luta, mas é preciso salientar que a categoria dos bancários é muito unida. Hoje nós somos quinhentos mil bancários no país e somos a única categoria que tem um acordo nacional, o quer faz com que as vantagens salariais sejam as mesmas em todos os lugares. No que diz respeito ao contato direto dos sindicalistas com os dirigentes dos bancos, há alguma discriminação, mas há também respeito deles com relação ao nosso papel.
Francisco Dandão – Os bancos pagam bem os seus funcionários hoje no Brasil?
Edmar Batistela – O bancário não tem um bom salário. Não se pode ser hipócrita para dizer que o bancário ganha um salário mínimo. Mas o que se paga está muito aquém do que deveria ser pago, levando-se em conta a responsabilidade do bancário e o lucro dos bancos. Para ter uma ideia, levantamento recente feito pelo Dieese [Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos], os bancários ganham mais ou menos a metade do que deveriam ganhar hoje. O piso salarial do bancário, pelo cálculo do Dieese, deveria ser de 2.980 reais, mas, na verdade, é de 1.519 reais. Essa disparidade se dá porque a fome de lucro dos banqueiros é insaciável, pouco importando o trabalhador que lhes possibilita esse lucro.
Francisco Dandão – E quanto às greves, presidente, como é que se faz uma greve de bancários e quais os resultados práticos imediatos de um movimento deste tipo?
Edmar Batistela – Pra fazer uma greve, por ser uma categoria nacional, reúnem-se todos os sindicatos num congresso e aí se deliberam as reivindicações que serão postas na mesa dos banqueiros. E os resultados tem sido expressivos. Posso citar dois exemplos: a questão da carga horária, que hoje caiu para seis horas diárias, e o ticket alimentação, que antigamente não existia. Os bancos jamais chegaram para a categoria acenando com melhorias por merecimento. Tudo só tem sido conseguido na base da medição de forças, com muita luta. É preciso salientar que os dirigentes sindicais não trabalham somente com greves. Na verdade, o que se pretende é o diálogo. A greve só acontece em última instância, pela inflexibilidade dos patrões. Tem-se conseguido, sim, grandes resultados e avanços com as greves realizadas pelos bancários.
Francisco Dandão – Duas perguntas, para finalizar a nossa entrevista. O que você ainda pretende fazer neste um ano que falta para encerrar o seu mandato e por quanto tempo você ainda pretende ser presidente do Sindicato dos Bancários do Acre?
Edmar Batistela – Os bancários terão agora em 2014 mais uma campanha salarial. E eu pretendo me empenhar para leva-la a bom termo no âmbito aqui do nosso sindicato, assim como foi feito nas duas campanhas anteriores, cujos resultados foram expressivos. A categoria vai ser ouvida e as suas reivindicações serão levadas mais uma vez à mesa de negociação. Com a segurança que os bancários têm hoje, a partir do sindicato, eu acho que nós temos tudo para conseguirmos grandes conquistas. Esse é o principal plano para o resto do mandato. E quanto a permanecer na presidência do Sindicato dos Bancários do Acre, o nosso Estatuto faculta o número de reeleições. Se a categoria bancária achar por bem, eu pretendo me candidatar a mais um mandato. Mas isso somente se os bancários entenderem que eu sou merecedor da sua confiança. Caso contrário, existem no meio da categoria novas lideranças, pessoas competentíssimas na gestão do sindicato, outros que mais recentemente começaram a sua participação político-sindical e que se quiserem vir contribuir para a categoria podem nos procurar que eu me mantenho sempre aberto para o diálogo. Eu entendo que o sindicato tem sempre que melhorar, seja comigo ou com alguma outra liderança que esteja disposta a encarar a luta.