POR MANOEL FAÇANHA
Dificuldades que são superadas dia por dia – assim vivem as pessoas com algum tipo de deficiência. Muitas delas, porém, se mostram mais do que guerreiras, encontrando na vontade de vencer na vida uma forma de superar os obstáculos e encantar quem está a sua volta. Um exemplo vivo disso é o assistente de gerência do Itaú Unibanco, da agência Bosque, em Rio Branco, Levi Barroso de Araújo, 37 anos.
Deficiente físico desde os sete meses de idade, vítima de uma grave poliomielite, Levi hoje leva uma vida quase normal. O sorriso estampado no rosto e o aspecto comunicativo retratam muito bem as suas características diárias na sua mesa de trabalho.
Nascido na zona rural de Rio Branco, Levi teve uma infância nada fácil. Filho dos agricultores rurais Otacílio Costa do Araújo e Francisca Barroso, dependia da mãe para suas necessidades básicas diárias. A situação clínica do bancário viria a melhorar somente após um longo tratamento de oito meses ocorrido no Hospital Sarah Kubitschek, na cidade de Brasília, em 1988, quando então com 12 anos de idade, teve que passar por uma cirurgia, a qual possibilitou a sua locomoção através de aparelho auxiliar.
Com seis anos de idade, deixou a zona rural de Rio Branco para morar no bairro Cidade Nova. Neste mesmo período, ele iniciava sua primeira experiência educacional na escola Luíza Carneiro Dantas. Com muito esforço concluiria o segundo grau. Já a primeira experiência profissional ocorreria na função de cobrador de uma linha de ônibus urbano da empresa Viação Rio Branco, em 1994, onde ficou por nove anos, até a aprovação num teste destinando a PCD (Pessoas Com Deficiência), na agência do Banco Itaú de Rio Branco.
Nas próximas páginas, conheça melhor a vida desse portador de deficiência física que aos 27 anos virou bancário.
A INFÂNCIA DIFÍCIL
Falar da infância é algo que traz recordações nada fáceis para Levi Araújo. Sentando numa mesa de um restaurante de Rio Branco, com os olhos quase lagrimando, durante uma folga para o almoço, ele abriu o coração para a reportagem da Revista dos Bancários do Acre para falar da deficiência física adquirida aos sete meses de idade, após um surto de poliomielite ocorrido no ano de 1976, em Rio Branco.
Levi explica que na época em que adquiriu a doença a família vivia na zona rural, a uns 50 quilômetros de distância de Rio Branco (BR-364). O acesso, à época, era difícil e as campanhas de vacinação contra a poliomielite praticamente não existiam. Ele explica ainda que chegou a tomar duas doses da vacina, mas restou a última dose. No entanto, não culpa ninguém pelo episódio, apenas ao próprio destino, e agradece a Deus por ainda estar vivo para contar a história, pois, segundo ele, existiam no período vários registros de óbitos ocasionados pela doença.
ESPERANÇA DE DIAS MELHORES
A infância pobre e cheia de dificuldades é algo que não traz boas recordações na vida de Levi Araújo. O assunto só é amenizado ao falar do esforço da própria mãe para dar esperança de dias melhores a ele e aos cinco irmãos.
Entre um detalhe e outro da difícil infância, ele conta que a mãe, dona Francisca Barroso, dedicava cada minuto de sua vida ao sustento dos filhos, assim como à tarefa diária de ajudá-lo a fazer suas necessidades básicas e de, costumeiramente, levá-lo nos braços às seções fisioterapias.
A esperança de dias melhores na vida de Levi Araújo veio somente quando aos 12 anos, através do esforço da própria mãe, com auxílio do Estado, seguiu a tratamento na cidade de Brasília. Lá ficou por oito meses e passou por algumas cirurgias corretivas de nervos nas duas pernas, assim dando condição para poder usar uma cadeira de rodas e, posteriormente, se locomover através de aparelhos (muletas).
“A partir daí minha vida mudou para melhor. Ganhei mais prazer para viver e, aos poucos, conquistei a minha liberdade de ir e vir”, comentou Levi.
ESTUDO E TRABALHO
Na infância e adolescência, Levi concluiu o primeiro grau na escola Luíza Carneiro Dantas e o segundo grau na escola Flaviano Flávio Batista. Com o sonho de ajudar a mãe no sustento familiar, aos 17 anos passou a procurar emprego. Com as muletas sob os braços foi à luta.
Levi lembrar que por várias vezes andou cerca 1,5 quilômetros com muletas para buscar uma vaga de cobrador na empresa de ônibus na Viação Rio Branco. Segundo ele, certa vez, o gerente geral da empresa Antonio Galvão, reconhecendo seu esforço, quis saber o que ele fazia ali na empresa que administrava. Levi, não pensou disse-lhe que queria uma vaga de cobrador. O gerente então solicitou o currículo. Daí em diante foram 11 anos na atividade de cobrador passando pelas linhas do Norte Sul, Amapá, Vila Acre, Manoel Julião e outras. O trabalho iniciava por volta das 3h30 da manhã para pegar o carro da empresa e terminava somente no início da tarde.
Mesmo empregado, Levi sonhava com dias ainda melhores na vida. O maior sonho era um dia ser bancário, fato muitas vezes confidenciado ao amigo Neto, funcionário do Bradesco – Agência Mal. Deodoro, centro de Rio Branco.
CHEGADA AO BANCO ITAÚ
Em 2005, Levi ficou sabendo de uma vaga aberta no Banco Itaú para Portador Com Deficiência (PCD). Era a oportunidade que queria para realizar o sonho de ser bancário.
“Lembro-me como fosse hoje. Sentei numa cadeira na frente do gerente comercial da agência Rio Branco Felisberto Brites para o processo seletivo e, posteriormente, passei pela entrevista do psicólogo. Dias depois, fui chamado para trabalhar e quase não acreditei”, contou Levi.
EXEMPLO DE SUPERAÇÃO
A chegada ao banco, para Levi Barros, foi e continua sendo uma grande oportunidade de vencer na vida. Caminhando para dez anos de carreira nas fileiras do Itaú, o bancário com certificação anbima CP10 aguarda uma promoção para gerência média.
Na época de sua chegada ao banco, precisamente agência Rio Branco, o responsável pelo setor operacional era Nilton Ademir, hoje dirigente sindical liberado do Sindicato dos Bancários do Acre. Segundo ele, Levi, no início da carreira, tinha dificuldades para se locomover dentro da agência, pois ainda dependia da sua cadeira de rodas, hoje algo já superado.
Nilton define Levi como um exemplo de superação. “Mesmo enfrentando uma infância e adolescência pra lá de difícil, jamais deixou de acreditar no próprio potencial. Venceu o preconceito, construiu família e serve de exemplo para muitos de nós, pois jamais reclama da sua deficiência. Pelo contrário, como poucos ele sabe transmitir otimismo, alegria e motivação as pessoas que o cercam”, explicou Nilton Ademir.
PRECONCEITO?
Hoje, no Brasil, os deficientes físicos representam aproximadamente 40% do total de pessoas com necessidades especiais. Por isso, a luta não se baseia apenas na melhoria das calçadas e rodovias públicas. Mais do que acessibilidade física, busca-se transpor barreiras e dar condições para que tenham acesso à cultura, lazer, educação e, principalmente, ao mercado de trabalho, terminando de vez com o preconceito ou qualquer tipo de discriminação.
Na avaliação do bancário, a questão da sensibilidade tem avançado se comparamos as últimas décadas. Em relação ao preconceito, a realidade é outra, hoje, segundo ele, existe mais respeito para com os portadores de PCD (Pessoas Com Deficiências).